20 de março de 2010

“A música é boa quando nos preenche a alma”

Por Bruno Zanini Kairalla
- Sugestões: bruno.kairalla@gmail.com
- Fotos: Bruno Kairalla / Divulgação/ Marcos Tadeu Medeiros



“Tenho interesse pela música desde quando minha memória permite lembrar”, pontua a nossa entrevistada Giovana Suita Freitas, 46 anos, que dá continuidade à série Mulheres Especiais, em comemoração ao centenário do Dia Internacional da Mulher. Nascida - e com orgulho - no dia 22 de novembro, data em que se reverencia o Dia da Música, ou do Músico, a vice-diretora da Escola de Belas Artes Heitor de Lemos (Ebahl) e também professora de música do Instituto Estadual de Educação Juvenal Miller, onde estudou por toda vida, Giovana é uma das profissionais admiradas e mais respeitadas da cidade no que se refere aos conhecimentos de sua área, que envolve além da música, o canto.

Com o característico bom humor que carrega desde a infância, por vezes até um pouco ácido, como frisa, Giovana, dona de uma voz grave, um timbre do tipo contralto, cantou pela última vez na 5ª edição do Garotas Fazem Arte, em que sob fortes aplausos foi a primeira artista a abrir o evento, encantando o público com músicas, como Summertime de George Gershwin, Only You, de Buck Ram e Ande Rand e, encerrando com, “Oh Darling”, dos Beatles. Ao fim daua apresentação, os aplausos soaram ainda mais altos. Tudo porque, Giovana não só emociona quando canta, mas também emprega um jeito único ao interpretar as canções que marcaram época.

Para ela que no passado já cantou ao lado de feras como o grande violonista e guitarrista rio-grandino, Ary Piassarolo, é um orgulho participar da vida cultural de uma cidade, na qual reforça o título de celeiro de grandes artistas. Muitos deles tiveram a sorte de serem não só descobertos, mas refinados e aprimorados por todos os seus conhecimentos. Ao se titular “barrista”, também revela um amor incondicional por Rio Grande, e destaca a Laguna dos Patos, como outro de seus pontos fortes. “Adoro passar pela rua Riachuelo e sentir o cheiro da maresia. Acho um privilégio termos a praia do Cassino, a Ilha dos Marinheiros, tão linda”, afirma a rio-grandina, um exemplo de talento, simpatia e muita determinação, como você acompanha nos parágrafos a seguir.


 
Trajetória
Formada em música pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel) onde depois também concluiu graduação em canto, as primeiras recordações de Giovana na infância datam por volta dos quatro anos, quando corrigia as desafinações de seus familiares. Também nesta idade já adorava os programas musicais e as propagandas feitas pelo seu padrinho Lúdio Porto Alegre. Das lembranças mais ativas, ela recorda que sua casa sempre foi contagiada pelo hábito de escutar música, de vivê-la. Com um pai músico, responsável por tocar contrabaixo num conjunto da década de 60 e a mãe, uma estudante de piano no antigo Conservatório de Música, a trajetória da rio-grandina não podia ser diferente e nem menos estimulante.

Outra de suas recordações mais marcantes foi quando já aos 9 anos pediu um violão ao pai e, enquanto esperava, sonhava sentindo a sensação de tocar no ilustre presente. “Nos sonhos sentia o perfume do meu violão novo. Um cheiro bem característico de madeira. Era algo muito real”, comenta Giovana, contemplada depois pelo instrumento. “Com ele aprendi a tirar os primeiros acordes. Da marca Giannini, conservo ele até hoje”, revela a talentosa artista, que na infância adorava imitar as performances de Wanderléa. Depois, já na adolescência, despertou a paixão pelo Queen e os seus arranjos vocais.

“Hoje, sempre digo que sou eclética. Entre outros, escuto, Diana Krall, Ella Fitzgerald, Aretha Franklin, Edson Cordeiro, Ana Carolina, Marisa Monte, Joss Stone, Elza Soares, Seu Jorge, Janis Joplin e gosto muito do timbre vocal de Amy Winehouse”, enumera. A professora adora blues e jazz e afirma que dentro de suas preferências não existe apenas uma única música que mexa com suas emoções e sim várias, pois tudo depende do seu momento. Porém aponta algumas de suas preferidas: “Summertime (ária da ópera Porgy and Bess) de George Gershwin. E gosto bastante também de “Alfonsina y El Mar” de Félix Luna e Ariel Ramirez e “Cry Me River”, de Arthur Hamilton”.

E para quem nasceu no dia do músico, o significado desta arte que sempre preencheu o mundo, não poderia ser muito diferente: “Tem uma frase em inglês que diz: Music is my life [Música é Minha Vida]. E este é meu lema, pois tudo gira em torno dela. Na música encontro abrigo e resposta para todos os meus momentos, sejam eles alegres ou tristes”, evidencia. 



  Com a mestra de canto Terezinha Röhrig, em apresentação no Teatro Sete de Abril




Carreira
Definindo-se como uma profissional metódica e perfeccionista, em sua área, Giovana ressalta que o que mais lhe atraí é a voz. “O canto e suas possibilidades: canto coral e canto solo”, fala. Apesar da formação erudita e que lhe auxilia dentro da construção da música popular, é esta última a preferida da professora. “Identifico-me muito com a música popular, como diz o nome, música do povo. Identifico-me com o patrimônio cultural de um povo”, estabelece.

Em relação ao crescimento musical profissional, Giovana acredita que o artista precisa, antes de mais nada, contar com a humildade. “Para melhorarmos musicalmente temos que ter a humildade de saber que sempre existe alguém melhor do que nós tecnicamente e tem que haver muita dedicação. A música é maravilhosa, mas, ao mesmo tempo, é ingrata. Exige muito esforço e dedicação. Quando fui estudar em Pelotas tive a sorte de estudar com bons professores onde, por exemplo, tive como mestra a soprano Terezinha Röhrig”, expõe.



Juvenal
No Juvenal Miller estudou do jardim de infância até terminar o Ensino Médio. Depois, por quase um ano, cursou Geografia na Furg, até descobrir que esta não era a sua praia e passar no vestibular de música da UFPel. Professora do Juvenal desde 1993, sobre a sensação de aluna passar a professora de música do Juvenal, ela descreve: “Tenho um amor muito grande pelo Juvenal Miller, pois além de ter minha trajetória lá, foi como professora dessa escola que pude mostrar o meu trabalho, montando corais de alunos”. De forma diferenciada e voltada para uma educação de qualidade, a direção possibilita aulas de música aos alunos. “Chegamos a gravar dois CDs e participar de festivais fora da cidade e também de professores”, complementa.

Ebahl
Como sempre fez parte da carreira pública, tanto municipal quanto estadual, em 2003 surgiu o convite e a possibilidade de trabalhar na Escola de Belas Artes, onde lecionou primeiramente aulas de violão. Na vice-direção está inserida desde 2006. Sobre a escola e os desafios que ela gera, Giovana analisa: “Dentro da área musical, o grande desafio foi manter e melhorar o nível da escola, pois a Ebhal goza perante a comunidade de muito prestígio e nela estudaram grandes músicos, como: Alessandra Féris, Guilherme Bulla e Ismael Domingues. Trabalhar nela é maravilhoso, pois temos a oportunidade de respirar arte todos os dias, nas aulas, nos vernissages, recitais e apresentações de dança, assim como conviver com artistas de outros lugares”.

Para ela, no Juvenal, onde trabalha com canto coral, também não é diferente: “Tive a sorte de ter sido a primeira professora de alguns alunos e ver o surgimento de vocações e artistas que hoje estão no meio musical de nossa cidade. Todos com muito talento. Entre eles, destaco o tenor Giovani Bertolino Correa, Paula Chaves, Milene Cacciamani (vocalista da banda Tracy Lords) e Aline Pinheiro”. Sobre a importância do canto coral, sintetiza: “O canto coletivo tem um alto poder de sociabilização, ajuda a formar indivíduos com as competências e atributos necessários a convivência social. No coral aprendemos a escutar o outro, além de proporcionar descontração e relaxamento”.




Cultura em Rio Grande
Como agente ativa cultural do Município, perguntamos a ela a sua avaliação nessa área. Diplomática, Giovana responde: “Acredito que sempre está se tentando melhorar, haja vista os investimentos e também surgimento de projetos, como a Quadra da Cultura que funcionou no Cassino neste verão, e onde os artistas rio-grandinos puderam mostrar um pouco do seu trabalho. Como promotores de cultura acho que hoje nos equiparamos a Pelotas, ou quem sabe, estejamos melhores. O que precisamos é informar e formar mais público. As pessoas precisam prestigiar, participar dos eventos, como sempre é dito, Rio Grande é um celeiro de bons músicos e como exemplo Beto Federal, Gigi Guterres, Guilherme Bulla, Chico Padilha, Veloir, Willian Jones entre muitos outros”, destaca.


Iatista e campeã
Além da música, Giovana possui outra paixão: o iatismo, “agora deixado um pouco de lado”, comenta. A descoberta se deu depois que nosso repórter encontrou em sua página virtual do Orkut uma foto como campeã de natação, em 1977. “Passei minha infância e adolescência no Yacht Club, onde aprendi com o meu pai a nadar e a velejar. No Yacht participei de algumas competições nestas duas modalidades. Depois me tornei instrutora de vela no iate, em que tive oportunidade de ensinar esse esporte para algumas crianças. O iatismo é um esporte maravilhoso e deveria ser oportunizado às crianças, assim como o ensino da música”, explana. Outra paixão abertamente demonstrada é por sua gatinha de estimação, a “Vicky”, de raça Siamês. “Adoro felinos”, expõe. 


 
Música que preenche a alma
Por fim, indagamos: “Em termos gerais, como analisas o contexto atual da música e do canto no Brasil? Funk, pagode, duplas sertanejas, mulheres frutas, revelam hoje a nossa curta cultura? “Não gosto desse tipo de juízo entre melhor ou pior. Prefiro aceitar que existe a diferença. A música brasileira atual está repleta de preciosidades escondidas e a margem da mídia. Quanto a qualidade, seja no passado ou no presente, sempre terá as pérolas e os poluidores. Há, sim, uma grande diferença da música do passado para a atual, no que toca a estética e tecnologia. Porém, a música é sempre boa quando nos preenche a alma”, conclui Giovana, que no futuro se imagina uma senhora com alma de criança, “mas, infelizmente, tendo que parar de cantar, pois a voz envelhece e já não temos mais a mesma agilidade vocal”.



Um comentário:

  1. Gostaria de apenas dizer que nada do que foi dito, para mim é novidade.Aprecio a arte e a companhia da Giovana a décadas e fico muito feliz de saber que mais pessoas tiveram essa oportunidade.Parabéns ao jornal por saber representar tão bem nós mulheres!!! Valeu Jojo.

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