A moda que não tem idade
Por Bruno Zanini Kairalla
- Colaboração: Karol Ávila
- Sugestões: bruno.kairalla@gmail.com
- Fotos: Bruno Kairalla
Cardigan de tricô ou crochê. Camisa de colarinho bordado. Saia marrom até a canela. Meião com chinelo. E uma manta bem quentinha sobre os ombros. Calçola bege?!
É difícil não imaginar estes itens – tão tristes – compondo o visual da mulher madura quando se fala em moda inverno para a terceira idade.
Tentando acabar com a poeira que ainda paira sobre o guarda-roupa de muitas vovós, uma loja em Rio Grande desenvolveu um desfile com modelos do próprio bairro em que está inserida e de todas as idades.
Mas foram elas, as vovós, que roubaram a cena ao apresentarem as novas coleções para um público consumidor considerado cada vez mais forte, exigente e poderoso!
A VITRINE TAMBÉM É DA TERCEIRA IDADE
Faz tempo que a sua vovózinha ficava o dia inteiro tricotando, sentada em uma cadeira de balanço com o seu “look” estilo Dona Benta, não é mesmo?
Hoje, com a moda cada vez mais voraz, abrangente e democrática, a terceira idade está cada vez mais sob o alvo dos empresários da moda e também dos grandes costureiros.
Um estudo realizado pela Itaucard sobre Cartões de Crédito na terceira idade, mostra que mais de 10% do valor total das compras efetuadas com cartão no país são feitas por esse público, um faturamento que gera anualmente mais de R$ 8,4 bilhões e que só cresce a cada dia.
Outras pesquisas já apontaram e quem está atento ao mercado já percebeu: são muitas as oportunidades de bons negócios que atraem este público, já chamado de “consumidor especial”, fiel a marcas e disposto a fazer compras sempre nos mesmos lugares e o que é melhor: com dinheiro no bolso.
Entretanto a indústria da moda ainda engatinha para conhecer o perfil deste consumidor. Porém ela já notou que a melhor forma de atraí-los está no conforto e nos detalhes.
Em pesquisas já realizadas, também perceberam que a grande maioria dos idosos procuram costureiras para roupas sob medida, porque a modelagem oferecida pelo mercado não atende ao seu padrão físico; porém gostariam de encontrá-las prontas nas lojas.
A maior parte delas prefere roupas de malha e um bom número usa jeans. Elas também preferem roupas com fechamento facilitado por botões ou fechos mais práticos, cinturas mais altas e roupas discretas, sem exageros.
Enquanto o mercado ainda se debruça para estudar este tipo de consumidor, uma única verdade fica a parte: o vestir-se bem, de acordo com a modernidade, não só estimula a feminilidade, a autoestima, como também gera um maior interesse pela vida, acionando a criatividade e o autoconhecimento. E isso equivale para todas as idades!
NA PASSARELA...
Na semana passada, uma sugestão de pauta chegava a nossa redação, através do site de relacionamentos sociais, o Orkut. A reportagem foi sugerida pela leitora, Raquel Prisco Vargas, 25, filha de dona Maria Luiza Prisco Vargas, 56 anos, uma das quatro senhoras representantes da terceira idade, convidadas a desfilarem pela loja Achei Variedades.
O desfile ocorreu em frente a loja, na noite da última sexta-feira e, claro, a equipe do Feliz Idade estava lá para conferir todos os detalhes. A seguir, um rápido histórico da loja, o desfile e as modelos que mostraram na passarela charme, elegância, empatia e também muita descontração fazendo bonito ao exibirem ao público as peças das novas estações.
>> A precursora
Há mais de 20 anos inserida no mercado, a loja Achei Variedades, localizada no bairro Miguel de Castro Moreira (antiga Municipal) é administrada por Maria Helena Silva, 48 anos, filha inquieta aposentada Erotildes Bigliardi de Freitas, na verdade, a idealizadora da loja.
De acordo com a filha, dona Erotildes, que sempre foi admirada pelos filhos por possuir um espírito para lá de empreendedor, sentiu-se parada e sem objetivos quando a aposentadoria chegou aos 65 anos.
“Na verdade, foi tudo ao mesmo tempo. Os filhos casaram e bateu nela aquela famosa síndrome de ‘berço vazio’, que se somou a falta de trabalho gerada pela aposentadoria. Ela não queria simplesmente envelhecer”, explica Maria Helena.
Segundo a proprietária, para se ocupar, foi neste momento que Erotildes resolveu abrir uma loja de confecção, num dos modestos quartinhos que sobravam em sua casa. “Era uma loja só de bordados, com peças variadas, de cama, mesa e banho, mas que tomou uma proporção imensa, crescendo rápido”, recorda Maria.
E para suprir a demanda, Erotildes tratou logo de construir uma garagem ao lado de sua casa. “Nessa época, ela já contava com o apoio de algumas vendedoras na rua, mas sentia a necessidade de possuir funcionários na loja. Bem, mais uma vez a loja cresceu e ela abriu uma filial”, evidencia a filha.
Maria Helena aponta ainda que quando o serviço duplicou foi convidada pela mãe para administrar a loja, que em seguida se tornaria de sua total responsabilidade. Com uma ampla estrutura, hoje a Achei Variedades emprega diversos funcionários.
Além de peças de bazar, a loja representa importantes marcas do mercado de confecção, estendendo os seus serviços para todos os públicos, inclusive, para a terceira idade. Sobre este público, Maria o caracteriza como um forte consumidor.
“A terceira idade forma hoje um grande nicho do mercado. É um público forte e trabalhamos com o objetivo de atendê-los da melhor forma possível, sempre trazendo novidades, ouvindo seus interesses”, comenta.
E dona Eroltildes? Engana-se quem pensa que ela parou de vez.
Mais uma vez, sentindo a necessidade de agir, a jovem senhora – que sentada em frente a loja na última sexta-feira, acompanhou com olhos vivos e bem atentos cada detalhe do desfile e não esconde o orgulho da expansão de sua loja –, realiza hoje um trabalho voluntário com grupos da terceira idade dentro da Igreja Batista, situada a rua Major Carlos Pinto, local que abriga um dos maiores grupos do público em nossa cidade.
“Sinto-me o máximo”
Mãe de sete filhos e avó de 30 netos, dona Roneida, 60 anos, acredita que estar na moda é muito importante. Além de encarar a passarela pela segunda vez, outra iniciativa que a jovem senhora destaca é a volta aos estudos.
Com um sorriso cativante, Roneida aponta que está em curso com o Ensino Fundamental e que pretende dar continuidade a essa atividade.
Já em relação a moda, ela afirma que este é um assunto que desperta e muito o seu interesse. Ela, que acompanha sempre que pode o programa exibido pelo SBT, “Esquadrão da Moda”, revela que já foi criticada por algumas pessoas por gostar de se vestir bem, como se o avançar da idade fosse sinônimo para a falta de amor próprio.
Sobre o desfile organizado pela Achei, sorridente, ela garante: “Sinto-me o máximo. Fico me achando".
Bonito estar na moda
Alzira Rodrigues, 69 anos, diz que geralmente compra roupas em lojas. Participante do grupo "Bom Jesus Vale a Pena Viver", formado para a terceira idade, ela acha bonito estar na moda. Revela também que está atenta e acha importante a investida de estilistas no mercado para esta faixa etária, que tende no futuro a dominar o mercado.
Com um olhar sóbrio, um charme clássico e postura rígida, sobre o desfile, dona Alzira conclui: "Feliz de quem chega a esta idade e pode desfilar", sorri ela, que dominou a passarela com muita desenvoltura.
E quem não quer?!
A quase integrante da terceira idade, Luiza Vargas, 56 anos, critica a despreocupação de muitas lojas que costuma frequentar não disporem de roupas apropriadas para a sua idade.
Segundo suas observações, as lojas simplesmente se entregam as tendências e se esquecem que nem todos gostam de um estilo padrão, geralmente desenvolvido para as mulheres mais novas.
Sobre as roupas especialmente feitas para idosos, ela afirma achar muito bom e necessário, já que, segundo ela, não existe quem não queira se vestir bem. Luiza revela ainda que “muitas senhoras acham que passaram da época e que as vezes a própria família discrimina".
Pela primeira vez na passarela, Luíza não escondia em seu semblante a expectativa. Antes de desfilar declarou que estava empolgada com a estreia e pela oportunidade: “Espero fazer bonito”, comentou. E fez. Luíza esbanjou charme e simpatia na passarela e caracteriza como “muito boa” a experiência.
Sentindo-se viva!
De todas as convidadas, ela foi a mais notável. Não pelas roupas que vestia, mas sim por todo bom humor e pela simpatia que emitia ao colocar a mãozinha na cintura e fazer caras e bocas durante o desfile, que com ela ficou com um ar todo descontraído.
E assim a extrovertida, Celene Gonçalves da Costa, 74 anos, diz que além de comprar roupas em lojas, gosta de produzir as suas próprias roupas.
Moda para ela?! “Uma forma de viver”, avisa. Quanto a dificuldade de achar roupas e peças que lhe caiam bem e que lhe sejam confortáveis, dona Celene salienta que quando as encontra, geralmente precisam de uns ajustes. Celene revela que sua filha a criticava sobre sua maneira de vestir, mas que isso não interfere no que faz de maneira alguma.
As espectadoras
As espectadoras do desfile, Noeli Alves da Silva (foto acima), 85 anos, e Alzira Conceição (abaixo), de 82, garantem que o principal motivo de estarem lá é que adoraram os outros desfiles da loja Achei. Afirmam ainda que gostam de estar na moda e que não sabem sair de casa sem se produzir.
Noeli destaca ainda que o motivo de sua vaidade está no sangue e aponta os pais que sempre gostavam de se arrumar como os culpados. Ela, que gosta de ser notada pelo seu visual, revela que vale a pena ficar bonita para que notem sua beleza.
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