Crônica: JU Blasina
- Malditas pesquisas! É de se admirar que haja tanta gente saudável no mundo! - escreveu ela, em seu status de Facebook, após uma madrugada navegando por alguns dos lugares mais inóspitos da internet: o fantástico mundo das descobertas científicas relacionadas à gestação.
Já não bastasse o susto que receber a notícia de que pelos próximos 9 meses, ou melhor dizendo, pelas próximas 42 semanas – nem se dê ao trabalho de calcular – seu corpo se tornará uma metamorfose ambulante, vem a maldita curiosidade a lhe guiar contra a fantasia “do momento mais mágico da vida de uma mulher”.
A primeira coisa que uma mulher recém-descoberta-grávida faz é partir para as pesquisas: o bisonho calendário da gestação, significado de nomes, o que se pode e o que nem se deve pensar em comer, beber, fazer...
E um novo mundo se abre, enquanto aquele que ela conhecia aparentemente se fecha perante os olhos arregalados de quem acabara de embarcar numa turbulenta viagem – e de gaiato!
Como (quase) todas as mulheres, ainda que a maternidade não fizesse parte de seus planos imediatos, ainda que sua vida – de solteira, moderna, independente e um tanto feminista – não comportasse tais mudanças para já, ainda que não tivesse estrutura nem econômica, nem financeira, tampouco afetiva para tal empreitada, julgava que saberia o que fazer assim que isso fosse uma realidade: seria a mais saudável grávida da história da humanidade, graças a sua rotina de exercícios, dos cuidados com a pele, com a dieta, já equilibrada, e ao sono bem dormido de cada santa noite... Mas, o universo sabe o que faz para dobrar línguas presunçosas.
Vivia a fase mais boêmia de sua vida: bebida, cigarros, noites em claro pelos botecos da vida, quando recebeu a pedrada da notícia.
Instantaneamente, largou o que quer que trouxesse nas mãos e as levou a cabeça: havia um mês que levava um hóspede silencioso às suas noites de farra.
E com as possíveis consequências disso em xeque, o universo riria da cara dela pelos longos próximos meses.
- PQP! Se a próxima frase que eu ler proibir o chocolate, juro que vou ficar inerte nessa cama pelos próximos 8 meses! – disse ela, um tanto irritada, após ter lido em todas as possíveis “dicas para uma gestação saudável” que todos os seus tão estimados hábitos deveriam ser abandonados “para todo o sempre, amém”, ou enquanto durar a atual condição em que se encontrara, ou seja, pelos próximos 8 benditos meses: sem bebidas alcoólicas, sem canela, sem gengibre, sem pimenta, [quase] sem café, chocolate ou chá verde, azeitonas ou qualquer coisa que traga sabor!
Sorte a dela em gostar tanto de espinafre - esse pode... E aos lotes!
Sorte a do bebê em estar num útero pseudo-vegetariano: o que se perde em carne vermelha, ganha-se em grãos, castanhas, legumes e frutas – tomar que ele se contente mais do que ela com o cardápio “do navio”.
E dá-lhe leite, muito leite onde antes havia vinho e outras delícias líquidas, mas... Qualquer sacrifício é válido na penitência de superar possíveis traumas causados pelo primeiro mês de ignorância.
- Agora fico pensando em toda a fisiologia que carrego na barriga... - dizia ela, mais a si mesma que a qualquer ouvido.
- Agora fico pensando em toda a fisiologia que carrego na barriga... - dizia ela, mais a si mesma que a qualquer ouvido.
- É mesmo de se admirar que tanta gente nasça saudável, com todas as chances de que algo dê errado, por mais certo que se faça, coma, beba, RESPIRE! – completou a apavorada de primeira viagem.
- E ainda assim, eles nascem... Sorte a deles! Cá estamos nós, para confirmar o feito: sorte a nossa - isso, ela não disse, mas pensou enquanto concluía mais um texto do tipo “o que esperar quando se está esperando”:
- Ora bolas, o melhor, só o melhor, sempre o melhor! Ainda que se ignore as estatísticas em prol do bem-estar.
O importante é focar o pensamento em algum lugar entre o que se espera na barriga e do futuro.
O resto... é neura, pura neura e nada mais.
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