Ela tem apenas 25 anos, carrega desde o berço o poder da oratória, um espírito cheio de liderança e como atual coordenadora de jornalismo da rádio e da TV da Universidade Federal do Rio Grande (Furg), cargo em que conquistou no final do ano passado, possui a obrigação de ter sempre uma posição, uma opinião formada sobre absolutamente tudo. Nada que seja sofrível para ela.
Bruno Kairalla
Por Bruno Zanini Kairalla
- Fotos-reportagem: Bruno Kairalla/Arquivo Pessoal
- Sugestões: bruno.kairalla@gmail.com
- Editora: Rosane Leiria Ávila
Crítica, energética, humorada e criativa, Sheron Barros Nicolette, não gosta de seguir as tendências que não lhe convencem, as regras expostas de forma básicas e certinhas e nem padrões tão pré-estabelecidos.
Pelo contrário. Com uma personalidade forte, contestadora e pra lá de estimulante, se possível sempre dá um jeito para empregar um toque pessoal seu em tudo e se algo lhe soa muito comum, então é hora dela logo tratar de questionar, rebater e transformar.
Arquivo Pessoal
Ela também ostenta com orgulho o fato e o dom de ser uma comunicadora que não só se aventura e passeia por diversas tribos, como também aprendeu a exprimir delas o que melhor possuem para oferecer. “Nunca fui de fazer média com ninguém e sempre tentei emitir minhas opiniões mais sinceras sobre os assuntos que são discutidos”, profere.
Gosta tanto de ser mulher, que define seu gênero como algo fantástico e maravilhoso. E também faz graça: “Sempre brinco que gostaria que todos meus filhos fossem homens, pois assim vou ser a única mulher da família”, diverte-se.
Sim, ela possui o sonho de ser mãe e filha única que é – por parte de pai tem outras duas irmãs que lamenta não ter tido uma convivência maior – ela garante que ainda quer ter muitos filhos. “Filha única já basta eu e não dá. Quero muitos filhos”, espera.
Das barreiras e adversidades sofridas no passado, ela comemora a conquista e liberdade da feminilidade como forma mais plena da referência de “ser mulher”.
Arquivo Pessoal
- Dificilmente uma mulher não é feminina. Só se ela não quer. Ser feminina é conseguir ver a beleza interior que emana em ti. É expressar toda a tua vontade, a tua liberdade no teu externo, no teu corpo, nas ações e na forma de como tu te coloca ao teu próximo -, percebe.
Das conquistas, ela também ressalta o fato da mulher ter obtido de fato o controle da sua vida sexual, do fazer sexo com e por prazer e não na obrigação ou por reprodução. Mas com isso, Sheron critica o fato da mulher ter se tornado um “objeto de erotização”.
- A mulher conseguiu sim derrubar muitos estereótipos, mas fez surgir novos -, aponta ela, referindo-se a figuras que acreditam que mini-saias e decotões são necessários para se firmar e conquistar notoriedade. “Isso não é ser sensual e nem é feminilidade”, defende. Outro ponto negativo dessa tal “liberdade feminina”, é a busca incessante pela perfeição da forma custe o que custar.
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- Muitas ostentam uma tarja preta na testa com a obrigação de ser gostosona, de possuir determinadas características que não condizem com a sua personalidade na obrigação de serem vistas como um objeto de prazer. O que acaba muitas vezes deixando uma pessoa estereotipada, com um comportamento padrão de outra pessoa. E com isso, perde-se a identidade. A mulher deixa de se reconhecer como é -, expressa-se.
- Os estereótipos não se extinguiram, o que houve foi um acréscimo. Os perfis, os papéis da mulher em sociedade, se somaram. Por exemplo, ainda hoje existem mulheres que apanham, não falam e não fazem nada. O perfil da mulher fragilizada que acha que não pode e que não deve, bem como o da mulher que o único objetivo na vida é cuidar da casa, dos filho. Alguns em menor proporção, mas ainda existe -, adverte.
Entretanto, ela também reforça o lado bom das características do novo padrão feminino.
Bruno Kairalla
Com a amiga, Alessandra Castro
- Com certeza, com o tempo quebrou-se alguns parâmetros. A mulher está aprendendo a se impor e a mostrar que tem personalidade. Além do avanço no mercado, da liberdade do prazer sexual, as mulheres evoluíram na tomada de posição, de criar a sua família da forma que bem entender, de ser mãe solteira, de adotar uma criança sozinha.
- Até porque a mulher não vê mais o homem como uma necessidade e sim o deseja para ser um companheiro. Do contrário, ela prefere ficar sozinha. Hoje, tu vê muitas mulheres que não querem nem ter filhos para ser totalmente independente -, destaca.
Bruno Kairalla
Além disso, por experiência própria, reforça o fato de ter se tornado comum a mulher assumir cargos de chefia em todas as frentes de trabalho. E, claro, defende sua posição: “Elas conseguem coordenar melhor do que muitos homens justamente por possuir uma delicadeza, uma destreza para tratar com pessoas”, acredita.
Feminina
Vaidosa como toda mulher de verdade, ela não esconde que como todas leva horas até escolher uma roupa.
- Não sigo um padrão. Na verdade a única coisa padrão em mim é o meu cabelo, que não muda nunca [risos]. Às vezes sou básica, gosto do estilo eclético, mas se tiver que ser extravagante, também sei ser.
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- Mas também tenho um lado careta. Não consigo acompanhar muita coisa da moda. Aliais, nunca vou fazer algo que eu não gosto para segui-la. Mas se me agradar, eu também não tenho nenhum preconceito com a moda, apenas não sou refém dela -, admite.
Ainda dentro do seu perfil, Sheron confessa que gosta de cuidar da casa, do seu jardim e que sonha em um dia ter uma estrutura familiar. - Até porque uma coisa não exclui a outra. Não é porque sou feminina que não vou querer ter uma família. É natural toda mulher sonhar com isso.
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- Só que por conta disso, ela não pode é se anular. Não pode ser só isso -, indica.
Quanto ao tema violência contra mulher, Sheron discorre que ela ainda existe em grande escala e parte de pessoas que menos se espera.
- A mulher pode ser mais explosiva, mais brigona, mas ela é mais contida. A violência, a agressão não faz parte de sua natureza. O homem já tem toda uma tendência para o uso da força. E olha que quando falo em violência também me refiro aquela de forma moral, verbal. Aquela que tu anda na rua e escuta uma piadinha ou uma coisa obscena.
- Muitas se sentem ameaçadas e para não ter que se expor a isso, mudam o rumo, o que acaba sendo uma poda na tua liberdade. Tem muita mulher que não sabe, mas é isso é crime, assim como é o assédio sexual, algo que também seguida vemos acontecer -, lamenta.
Curta, porém extensa trajetória
Próxima de completar 26 anos, no dia 13 de maio, a taurina já responde por um vasto currículo. Rio-grandina, Sheron deve boa parte de sua educação a sua avó, para ela, um parâmetro de mulher.
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- Identifico-me muitíssimo com a minha avó, ela é o meu centro, o meu eixo. Ela sempre foi de coordenar, dar ordens, contestar. Fui criada por ela e acho que tenho muito dela -observa.
Durante a sua formação, estudou por escolas públicas e particulares da cidade. E foi durante esse percurso, frente ao seu espírito de liderança, que descobriu sua vocação para a área da Comunicação Social.
- Sempre fui metida pra caramba. Fui líder de turma, baliza de banda, representante de grêmio estudantil, participei de vários projetos. Até prefeita fui eleita dentro da escola, numa campanha realizada dentro do Colégio São Francisco -, acrescenta ela, referindo-se a escola marista da cidade, onde concluiu o Ensino Médio.
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Inserida num dos projetos vocacionais da Escola, começou a conhecer a profissão de jornalismo. Até que por sua facilidade em se expressar e transitar por vários grupos, foi convidada a assumir não só a bancada, como também as reportagens da Escola, quando esta criou em 2001 o seu estúdio interno de TV.
Um ano depois, quando já cursava Jornalismo na Universidade Católica de Pelotas, Sheron retornaria ao colégio marista, desta vez, em novo destino: dentro da sala de professores, como bolsista da área de TV.
Também nessa mesma época, ingressou no curso de Letras da Universidade Federal do Rio Grande. Pela sobrecarga nas atividades, teve que optar. Optou pelo jornalismo, Desde então, vem trilhando uma trajetória de visibilidade e importantes conquistas.
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O jornal pelotense Noite & Cia [com colegas na foto acima] foi o primeiro veículo a atuar como repórter colaboradora. Nele, chegou a coordenar a área em Rio Grande, quando a direção apostou rapidamente no mercado da cidade.
Depois, morou num curto tempo em Pelotas e atuou em projetos da Católica, dentro de um jornal comunitário e de um projeto fotográfico realizado na Ilha dos Marinheiros.
No verão de 2005, colocaria os pés pela primeira vez nos estúdios da então, TV Furg. Como estagiária, chegou numa hora de mudanças radicais de sua identidade e ideologia. Participou da mudança de nome para “Furg TV” – pois a instituição está em primeiro lugar – e em seguida foi convidada a participar de um teste para a rádio Oceano. Nela, se tornou a primeira – e até então - única voz feminina na cidade, dentro do veículo.
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Era a segunda vez em que atuava no rádio. Entretanto, diferentemente da rádio 99.9 de Pelotas, na qual levava informações aos sábados a noite para os ouvintes num programa para jovens, estilo ‘pré-night’, na Oceano, foi contratada e respeitada como profissional, lidando com a sensação do domínio direto e instantâneo com seus ouvintes.
- Um lugar que aprendi muito, deu-me visibilidade e que conheci muita gente legal. Falar em rádio é sentir uma liberdade de expressão tremenda. O poder de ter um veículo nas mãos, em que tu abre o microfone e te tornas responsável por tudo o que tu fala, tendo a certeza de que naquele momento existem centenas ou milhares de pessoas te ouvindo e querendo interagir contigo. É muito especial -, transpõe.
Enquanto pôde, Sheron manteve os dois empregos, na Furg TV e na Oceano. Depois, ficou apenas com esta última, mesmo que por pouco tempo, pois chegou o dia de sua monografia. Obrigada a escolher, por mais uma vez acúmulo de funções, optou por se preparar profissionalmente e concluir o curso de jornalismo.
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Com o diploma em mãos
- No dia que entreguei o trabalho de conclusão, a Furg me chamou de novo e eu topei -, observa. Ainda nesse meio tempo, novas experiências apareceram durante as eleições de 2008: foi convidada a se tornar apresentadora e porta-voz das propostas políticas nos programas da Frente Popular (PT).
Com um poder de oratória singular e uma personalidade unica, Sheron foi elogiada por prestar uma identidade e uma cara nova a campanha. “Foi uma experiência fantástica”, define ela, que afirma não ser filiada a nenhum partido. O único contratempo foi receber críticas e até mesmo reclamações de cunho partidárias. “As pessoas confundem muito. Elas me viram como a “menina PT” e não como a jornalista que estava ali transmitindo informações”, comenta.
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Apesar disso, ela garante que se fosse convidada ingressaria na experiência novamente, no PT ou em qualquer outro partido que estivesse de acordo com as suas próprias ideologias. “Também fui convidada para apresentar em Pelotas, mas não fui porque não tinha nada a ver comigo. Mas faria de novo, sem dúvida. Claro, agora estou numa outra fase profissional e avaliaria o momento”, salienta.
- Se tem uma coisa que nunca tive foi medo de experimentar e conhecer a minha área de atuação. Sempre fui curiosa e gostei de saber como funciona ou como é tal veículo. Sinto que hoje estou mais preparada -, reflete.
Furg TV e FM
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Depois de passar por praticamente todas as mídias que abrangem o jornalismo, Sheron, agora voltada para o exercício pleno da comunicação educativa, ao lado de uma equipe composta por outros 20 profissionais, sente-se realizada no posto de coordenadora da Furg TV e Furg FM, que produz diariamente no mínimo uma hora de programação cultural.
- Nenhuma outra TV na cidade produz tanto como a gente. São cerca de 6 horas semanais produzindo assuntos que estão em volta da comunidade -, brinda. Ela que como estagiária participou da reestruturação da TV, traça uma análise do que se tornou a TV nos últimos anos.
- Gosto desse caráter político, democrático e público da produção de informação. Temos um compromisso democrático porque a TV é pública. Não dependemos de um patrocinador para levar nada ao ar e justamente isso dá a liberdade de dar voz a todos cidadãos que podem e devem ter voz aqui dentro, pois são eles que estão pagando. É um serviço feito para a comunidade e enraizar isso na cabeça de todos que entram aqui, jornalistas e produtores, é uma das minhas funções também -, enfatiza.
Bruno Kairalla
Nas atribuições de Sheron está o compromisso de garimpar, selecionar os assuntos que serão produzidos e levados ao ar, dando um foco e um direcionamento aos jornalistas da redação. “Discutimos a pauta, o formato das entrevistas, das reportagens, procuramos o lado educativo e a visão crítica que o assunto exige. Também avalio os traços no perfil de cada jornalista e o adequamos para um determinado estilo de programa”, comenta.
Enquanto coordenadora, para Sheron, seu maior desafio foi lidar não só com um grande volume de informações diárias, mas também com um enorme grupo de pessoas e muitas que viu se formarem junto, antes ou depois dela. “No início, foi difícil lidar com isso. Ainda mais com pessoas que possuem a mesma vivência e faixa etária que tu. Houve uma divisão da Sheron, colega e chefe no trabalho e depois, fora do expediente, de volta como a amiga”, aponta.
Ao vivo
Uma das grandes conquistas dela e de toda a equipe foi colocar a Furg TV ao vivo no ar pela primeira vez em sua história. O feito ocorreu primeiro com o programa de rádio que Sheron apresenta, o RU Café.
- Mas até aí era algo dentro do estúdio, o programa na rádio já é ao vivo, não teve muita novidades - conta. A grande estréia ocorreu mesmo na inauguração da 37ª Feira do Livro, logo depois que a equipe batalhou e adquiriu o link necessário para fazer as transmissões ao vivo fora do estúdio.
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O sucesso da iniciativa se repetiu nesta última semana, quando a TV foi parar dentro do Centro de Convivências na Furg, acolhendo toda a comunidade universitária.
- Foi algo inédito para todos. E aqui temos esse objetivo de fugir do tradicional. Meu papel é motivar e empolgar o grupo. E tem muita gente aprendendo, fazendo o que nunca fez. É maravilhosa essa oportunidade de experimentar. E isso só dá certo porque existe uma equipe coesa, preocupada com a qualidade de tudo que é levado ao ar. Um desafio para todos e que todos topam e fazem muito bem feito. Há uma entrega, um compromisso geral e isso é muito gostoso - assegura.
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- Tenho um baita orgulho do que faço. Apaixonei-me por esse tipo de jornalismo cujo grande diferencial é explorar o lado cultural da notícia, sem a preocupação com o que é factual. O que te permite realizar uma pesquisa e se aprofundar no assunto, trabalhando com uma linguagem didática, científica, de formação de opinião -, finaliza.
Homens
Na maioria dos lugares por qual passou, Sheron sempre trabalhou em sua maioria com homens. Prefere assim. “Sempre me dei melhor com homens do que mulher no que toca o trabalho, pois sempre me senti acolhida e valorizada”, percebe-se.
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E afirma que apesar das piadinhas por conta de sua personalidade, - “Pra homem falta pouco, hein” - nunca passou por uma situação clara de preconceito. “Houve sempre um cavalheirismo muito grande. Sempre me respeitaram muito, em todos os lugares”, confirma.
- Por mais que eu seja feminina, vaidosa, mulherzinha, eu tenho uma linguagem com os homens muito próxima, até porque não tenho frescuras. Eles não vão mudar de assunto ou deixar de falar palavrão porque estou entrando na sala ou vão ficar com vergonha. E isso faz com que eu também consiga me aproximar deles de uma forma respeitosa e ao mesmo tempo brincalhona. Não há abuso de brincadeiras, mas ao mesmo tempo não há pudores. Há um balanço e isso eu acho bem legal - pontua.
Nunca é tarde para elogiar um ótimo trabalho, e essa reportagem do Bruno e da Rosane com a Sheron foi ótimo. Eu conheci ela em uma tarde de Sábado de Outubro de 2004, no CAIC lá da FURG. Era a prestação da prova prática do teste de aptidão do curso de Artes Visuais, ela já estava sentada em seu lugar quando, assim que entrei, avistei-a. Continuei a procurar um lugar quando de repente ela estava diante de mim. Mal me sentei e ela já foi puxando assunto e simplesmente começamos a conversar como se fôssemos velhos conhecidos. Foi um papo, e consequentemente uma tarde, mais do que agradável. Depois a reencontrei nas prestações das provas finais em Dezembro, ela estava na minha sala. Só posso mais dizer que é verdade cada linha do que esta máteria ótima diz. Só não me lembrava que ela fosse tão novinha...
ResponderExcluirAbraços e Sucesso!