18 de março de 2011

"Esquece", por Gabriel Colombo



Eu carrego comigo boas noticias.

Gostariam de saber?

Um dia, o homem nunca mais vai roubar, pois tudo terá. Brigar? Nem pensar, a amizade se instalará. Quem pedir sol terá belos raios. De tudo, luz, se fará. E, num especial dia, debaixo de toda ferida, mercúrio, logo, surgirá. 


A gente nunca mais irá usar sal nem pimenta, tudo será digestível e de gosto agradável. A gente não precisara complementos, todo elogio, já estará. Toda coisa terá encaixe perfeito. Meu corpo no teu. E nunca mais teremos disparidades. E tudo será de praxe. E duvidas para que? 

Veremos melhor que nosso organismo é corpo e é prisão. Entre um tato, uma cor um saber, um ruído, uma dor e uma onda, não precisaremos mais de vírgulas. Pois claro, tudo terá sentido. O esgotamento, nunca terás. E, enfim, a gente nunca mais vai ter vertigens. No abismo, a gente se encontrará.


Escutei a conversa de dois senhores sentados na mesa atrás da minha. Daqui do pub. Um se mostrou espantado lendo o jornal. O outro, tentou confortá-lo. 

Eles falavam sobre o que era impossível, E o que, agora se tornou possível. Um dizia para o outro: Quando que imaginei estar vivo e ver o Big Bang do Universo? Quando veria o DNA? Quando eu saberia sobre a Teoria da Relatividade? 


Quando eu expliquei que para toda ação há uma reação? E, quando fui pensar em me explicar, bem calmo, que me atrasei nas ruas tendo uma polonesa por cem libras, bem linda porque minha mulher está exausta de cuidar dos cinco filhos que fiz nela (!) e ela perdeu seu glamour?

E é sobre isso que falo... 


Quantas coisas nos achávamos impossíveis de ser, ou de ter, e hoje estão ai na prateleira? 

Basta tirar dinheiro do bolso. Ou imaginação. Ou alcance. Ou otimismo....

Quando meu pai imaginou assistir tevê a cores?

Quando minha mãe teve shampoo, ao invés de sabão de coco no tanque para dar volume aos cabelos?

Quando minha dinda tomou caramelo sunday MacDonalds sem derreter tão logo? E quando ela imaginou que cada sabor teria sua melhor cobertura na casquinha 3 minutos?

E quando eu pensei, cogitei sequer, de esquecer a enciclopédia, o guia telefônico e a revista pornô?


No Google, tudo eu encontro. 

Eu esqueci a marcha dura, pois tenho a hidráulica. (E quero curvas perigosas para sempre.) Minha professora de gramática deixou o mimeógrafo. Me testou em prova a la xerox. 

Foi-se o videocassete. Eu faço filmes de anos 30 aqui em casa e depois te boto na câmera. Deixa o abridor de lata. Passa a mão na tampa da long neck que ela se abre. Ah, e se não saíres bem na foto falando X, apaga! Não precisa de laboratório. Bata outra, meu lindo.


E querem mais? O cinzeiro vira até nós. A caneta terá carga infinita. Eu nunca mais chorarei caído no chão do banheiro. Teremos amores perfeitos (e) para sempre. 

Todo jazz vira num solo, eterno, perfumado de jasmim. E os médicos, cientistas e antropólogos estarão na linha 999, apenas esperando nosso próximo pedido. Ou ideia. Ou loucura. Ou quem sabe o quê.


Eu sei que amizades não terás mais que selecionar. Entenderás a vida como obra de arte. E dai, esquece tudo. Deita e rola. Solta esse copo e dança sozinho. A tempestade virá com música. E o CD arranhado virará um novo. 

Ao acordares, o som será de música de piano de cauda. Feito prata lusco fusco. Filme de ficção científica e coisa cafona. Derrete teu coração porque não há mais riscos além. Terás todas as garantias. E o melhor da festa estará sempre por vir. 


A vida é hoje. E é hoje, sim. 

Um dia, tudo isso será ossos e cinzas. 

Afinal, quando tu menos esperares eles podem levar embora o Paraíso e instalarem um cinzento estacionamento.

E eu não quero ficar parado.

Daqui onde estou eu espero cometas.

Gabriel Colombo, de Londres

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