28 de agosto de 2010

Quando os alunos são a sua melhor escola!


- Sugestões: bruno.kairalla@gmail.com
- Fotos-reportagem: Bruno Z. Kairalla

O assunto já é batido em qualquer ambiente social, no entanto, sua constante discussão torna-se sempre fundamental na formação de jovens que, independente da escola ou da família, decidem – e cada vez mais cedo - pelos caminhos que desejam e querem seguir.


Drogas são temas corridos, porém, superficialmente entendidos, principalmente quanto mais distantes de nós ou dos motivos que nos levam até elas. Talvez, por isso mesmo, a temática tenha servido apenas como um complemento de tudo o que foi abordado por estes estudantes nas manhãs de quarta e quinta-feira desta última semana.

Debate aberto,
crescimento direto


No mundo em que as informações correm na velocidade da luz, da internet e do contato virtual das redes sociais, já não é preciso esmiuçar o assunto. Melhor é vivê-lo, senti-lo em sua mesma proporção.

Responsáveis pela construção geral do espetáculo, estudantes de três turmas do terceiro ano do Ensino Médio, dominaram o palco do auditório da Escola Técnica Estadual Getúlio Vargas.

A principal proposta foi deixar os estudantes livres, longe de interferências para criarem uma peça cujo destaque fossem às drogas.


Criativos, ousados e ligados no contexto geral foram além ao contemplarem outros temas conflituosos, como a anorexia, a gravidez indesejada, os preconceitos (raciais, comportamentais e sexuais), e as relações familiares. Situações que em vários casos conduzem para o caminho das drogas.

Com isso, nos últimos meses, eles se revezaram no papel de direção, roteiristas, contra-regras, produtores, cenógrafos e, claro, atores. A trilha sonora também foi deixada por conta de seus gostos e escolhas.


Inspirados pelas histórias próximas de suas realidades, quando elas não se confundem com a sua própria, a principal mensagem deixada por seus trabalhos foi objetiva: Cada um tem o poder de decidir o que bem quer para a sua vida, como também, administrar as suas próprias conseqüências!

No controle de suas
próprias escolhas


Segundo a incentivadora, a proposta nasceu depois da dramatização de um julgamento, cuja temática foi a utilização de células tronco no tratamento de doenças degenerativas.

“Fiquei entusiasmada com a receptividade dos alunos e resolvi propor a realização de uma peça teatral onde o tema central seria o uso indevido de drogas. Das quatro turmas, só uma não quis participar do projeto. As demais ficaram entusiasmadas e trabalharam bastante”, conta a idealizadora e professora de biologia, Dulce Helena.


Quanto a liberdade de expressão, a professora assegura que, na verdade, o propósito foi provocar em seus alunos a busca pelas respostas de tantos questionamentos que hoje se fazem. “Durante os ensaios, ofereci algumas sugestões e eles escolhiam se aceitavam ou não”, pontua a professora.


Dulce comenta que esta não foi a primeira vez que provocou o debate – muito mais de ordem interior. “Em 2008, durante a semana do Ensino Médio de nossa Escola, eu e mais duas colegas apresentamos para os alunos e professores uma oficina sobre a homofobia e isto foi muito bom, pois permitiu que muitos fizessem uma revisão nos seus conceitos”.


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“O maior ganho deste trabalho foi perceber o conhecimento que eles possuem sobre os efeitos que as drogas causam na vida do usuário, da família e das pessoas que convivem com ele. E com este debate aberto fazê-los perceber que somente eles possuem o poder de decidir o que querem para suas vidas. Espero que de alguma forma tenha conseguido sensibilizar meus alunos de como a liberdade é importante e que as drogas escravizam”, conclui.

Resposta dos alunos


Em conversa com o repórter do Mulher Interativa, ao fim das apresentações, os alunos se mostraram bastante empolgados pela conclusão do trabalho. Também destacaram uma das principais forças nascidas com ele: a união da turma na elaboração do projeto. Todos foram contundentes ao reforçarem que se já não viveram ao menos conheceram pessoas que passaram por alguma situação exposta nas peças.


Ironias a parte, a roteirista de uma das peças, Deize Amaro (acima), 18, nem sonhava que estava grávida quando começou o trabalho, hoje vivendo o seu segundo mês de gestação. “Não planejei, mas estou tranqüila, porém, o único conselho que dou é: usem camisinha”, diz ela, que namora há um ano e já alguns meses vive com o seu companheiro.

Outro que também declara uma mudança em seu comportamento, principalmente em seu modo de pensar, é José Pereira da Silva Jr. (abaixo), 18. Júnior confessa que antes tinha um olhar machista e preconceituoso sobre os homossexuais.


Com um primo na família que enfrenta a discriminação, aos poucos o jovem foi mudando sua forma de encarar a realidade. A melhor prova dessa mudança ele diz que foi aceitar o desafio de encenar na peça uma personagem que passa por este tipo de discriminação. “Hoje vejo melhor o sofrimento e o desrespeito que estas pessoas enfrentam”, salienta.

Chave de ouro


Ao fim das três apresentações, a professora Dulce Helena Martins Faria, 48 anos, já não conseguia esconder a sua emoção. Não só porque foi homenageada carinhosamente por seus alunos, mas porque, sentiu-se em missão cumprida.

“Encerrei com chave de ouro”, disse ela na ocasião, que próxima dos seus 27 anos de atuação, no fim do ano terá a sua aposentadoria. Ao lado dela, o filho mais velho prestigiou o resultado de seu trabalho (abaixo).


Formada em Ciências Licenciatura Curta (1983) e Plena, com habilitação em Biologia pela Furg (1985), Dulce Helena, quando ainda nem pensava em ser professora, “queria ser veterinária”, cursou o ensino fundamental na Escola Bibiano de Almeida e depois no Colégio Lemos Júnior.

“Como só havia curso de veterinária em Pelotas acabei indo para a área de Ciências, o que me direcionou para o Magistério. Hoje, mais do que nunca, sei que nada é por acaso, isto é, tenho convicção de que fiz a escolha certa”, completa ela, que ainda ensina:


“Nestes quase 27 anos de profissão posso afirmar que mais aprendi do que ensinei, pois uma depende da outra e ensinar implica também no ato de aprender”, observa.

Avaliação profissional


“Penso que se os políticos realmente se preocupassem mais com a educação, as nossas escolas seriam ambientes bem melhores com mais recursos, prédios mais conservados, professores mais motivados e melhor remunerados, e como consequência disso tudo nós teríamos um povo mais culto e educado”.

Quanto à aposentadoria, Dulce Helena confessa-se assustada pelo desligamento que isso exigirá das atividades e contatos diários, entretanto, já programa retomar os estudos das aulas de inglês deixadas no passado, ingressar numa especialização na área da educação, além de dar a continuidade ao trabalho que presta para o Grupo de Mãos Dadas.

“E também ficar mais próxima da família, viajar e fazer tudo o que antes não foi possível por conta dos compromissos profissionais”, programa.

Lições

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Também perguntamos a professora qual foi a maior lição deixadas pelos estudantes. “Respeitar a individualidade e o tempo de cada um e o mais importante: através dos meus alunos, aprendi a lidar com os meus filhos, entendendo melhor todos os conflitos normais da adolescência”.


A professora também compara as maiores diferenças do comportamento de antigos e novos estudantes. “Noto os jovens hoje meio perdidos, sem objetivos. Isto muitas vezes dificulta o processo ensino-aprendizagem. Penso que muitas vezes a ausência da família [por motivos vários] e do diálogo favoreçam este cenário”, diz.


E aos novos educadores, sua mensagem: “Que façam do ato de ensinar um momento de prazer e não se deixem abater pelas dificuldades; que busquem através delas motivo para o crescimento pessoal e profissional”.

Quanto ao projeto, indagamos, por fim, a professora:

- Visto toda essa revolução tecnológica, a facilidade de encontrar informações, a senhora não acha que um projeto como este deva ser estimulado antes mesmo do Ensino Médio?

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“É óbvio. O diálogo tem de estar sempre aberto tanto na escola como na família desde a idade mais tenra. Não só drogas, mas também a sexualidade, o preconceito, o bulling, devem ser discutidos por todos os educadores (independente da disciplina), pela comunidade educativa como um todo, pois isto só contribuiria para uma sociedade melhor”.

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27 de agosto de 2010

Os Supercentenários

Esta é a expressão utilizada para quem consegue ultrapassar a faixa dos 110 anos. Sobre eles, acompanhe abaixo a pesquisa realizada na rede pelo repórter Bruno Kairalla.

Ann Pouder


- Ann Alexander Pouder (Londres, 8 de abril de 1807 - Baltimore, 10 de julho de 1917) foi uma das primeiras pessoas a conseguir provar que ultrapassou a idade de 110 anos.

Ann (imagem acima) emigrou com a sua família aos 12 anos de idade para os Estados Unidos, tendo vivido em Baltimore nos restantes 98 anos da sua vida. Passou os últimos tempos da sua vida acamada, cega e quase surda, contudo preservava-se lúcida.

>> Em tempo 1:

- As pessoas mais longevoas são reconhecidas pelo Guinness World Records - o Livro dos Recordes -, ou ainda pelo Gerontology Research Group (GRG).


- Para o Guinness a pessoa mais velha do mundo foi a norte-americana Edna Parker (acima), falecida aos 115 anos. Seguida dela está Yone Minagawa (abaixo), falecida aos 114 anos e o japonês Tomoji Tanabe (abaixo), considerado o homem mais velho do mundo, falecido em junho do ano passado, aos 113 anos.


- Entretanto, outras pessoas, inclusive brasileiros, já alegaram ter idade superior aos citados acima. Sem ter como comprovar através dos registros, porém, o Livro dos Recordes não os reconhecem.


- É o caso, por exemplo, de Moloko Temo (imagens acima), uma supercentenária sul-africana que alegou ter 134 anos de idade, o que, se comprovado, faria dela a pessoa mais velha de todos tempos.

Moloko Temo faleceu em 3 de junho de 2009 e encabeça a lista das pessoas que alegam o maior tempo de vida pelo Gerontology Research Group.


- O título de pessoa mais velha do mundo é até hoje atribuído à francesa Jeanne Louise Calment (acima), 122 anos, nascida em 21 de fevereiro de 1875 e falecida em 4 de Agosto de 1997.


Nascida na cidade de Arles, na França, Jeanne (acima) entrou para história ao atingir a marca de 122 anos [44.742 dias de vida]. Quando a construção da Torre Eiffel foi terminada, em 1889, Jeanne tinha 14 anos.


- Outra francesa é atualmente reconhecida pelo Guinness como a pessoa - ainda viva - mais velha do mundo: Eugénie Blanchard (acima), com 114 anos.


Nascida em St. Barts, na França, em 16 de fevereiro de 1896, ela foi freira por 36 anos e é uma das poucas pessoas ainda vivas já ter nascido no século 19.

>> Em tempo 2:

- Depois da sul-africana Moloko Temo, duas mulheres brasileiras procuraram obter o reconhecimento de pessoa mais velha do mundo, figurando inclusive na lista da Gerontology Research Group (GRG).


- A primeira delas trata-se de dona Maria do Carmo Gerônimo (acima), uma ex-escrava brasileira falecida em junho de 2000, supostamente aos 129 anos.

A data de nascimento de Maria do Carmo é atestada por documentos da igreja. No entanto, por não possuir uma certidão de nascimento, Maria do Carmo não foi reconhecida pelo Livro dos Recordes.


Filha de escravos, Maria do Carmo nasceu em 5 de março de 1871, em Carmo de Minas (MG). Na ocasião, faltavam seis meses para a promulgação da Lei do Ventre Livre e ela amargou a escravidão até os 17 anos, quando viveu a instituição da Lei Áurea. Sem parentes, tomou como família os Guimarães, com quem morava e trabalhava como empregada doméstica por mais de 60 anos.

- Desde 1995, quando começou a figurar como provável mulher mais velha do mundo, passou a receber homenagens pelo Brasil. Aos 124 anos, viajou de avião pela primeira vez. Recebeu das mãos do então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, a medalha do centenário de Zumbi dos Palmares.


No mesmo ano, realizou um antigo sonho: ver o mar. Religiosa, Maria do Carmo chegou a passar mal em 1997, quando foi presenteada com uma medalha pelo papa João Paulo II. Naquele ano, vítima de um derrame cerebral, Maria do Carmo viu sua saúde de ferro começar a definhar e, nos últimos meses, ela já necessitava de muitos cuidados médicos.

>> Em tempo 3:

- Falecida em 08 de julho último, na cidade de Astorga, interior do Paraná, a segunda mulher considerada como a mais velha do mundo é Maria Olívia da Silva.

Nascida em 28 de fevereiro de 1880, em Varsóvia, na Polônia, a família de Maria conta que ela veio ao Brasil quando tinha três anos, sendo registrada em Itapetininga (SP).

- Mais velha que o automóvel com motor de combustão interna à gasolina (1885), o rádio (1885), o cinema (1894), a geladeira (1895), a televisão (1927) e a penicilina (1928), Maria Olívia havia completado em fevereiro último, 130 anos.


- A idade e o local de nascimento nunca puderam ser comprovados oficialmente porque os documentos originais foram queimados acidentalmente quando ela morava em Centenário do Sul (PR), na década de 1960. Em razão disso, o Guinness Book nunca a reconheceu como a mulher mais velha do mundo. Dona Maria teve 14 filhos (10 legítimos e quatro de criação).

- Em várias entrevistas, Maria Olívia sempre afirmou que teve uma vida dedicada a lavouras de feijão, algodão e café. Segundo ela, o segredo da longevidade era a dieta baseada em banana e feijão. Nos últimos anos, ela havia perdido boa parte da visão e da audição e sofria com problemas no rim, coração e pulmão, o que a fazia permanecer sentada a maior parte do tempo.

>> Em tempo 4:

- Gerontology Research Group (GRG) é um grupo formado no início da década de 1990, constituído por investigadores na área da gerontologia, que se reúnem mensalmente em Los Angeles. O objetivo atual deste grupo é identificar pessoas que tenham atingido a idade de 110 anos - os chamados supercentenários.

>> Em tempo 5:

- Segundo o IBGE foram recenseados em 1991 o total de 13.865 pessoas centenárias no Brasil e, em 2000, 24.476 indivíduos, representando um aumento de 77% em nove anos.

- Cerca de 60% dos centenários em 2000, era composto por mulheres.

- A previsão é de que esse crescimento continue acelerado nas próximas décadas. A estimativa é de que em 2050 existam 160 mil pessoas com 100 anos ou mais no Brasil, o que representará uma população aproximadamente sete vezes maior do que a recenseada em 2000.

- Um balanço de 2007 sobre o Censo Previdenciário do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), apontou o número de 16,6 milhões de pessoas beneficiadas pelo sistema, mostrando que cerca de 3% (ou 491 mil pessoas) têm mais de 90 anos.

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Presolina Coelho ou "Catuia", 111 anos

Um ícone da longevidade


- Colaboração: Fernanda Miki
- Fotos-reportagem: Bruno Z. Kairalla

Fundada oficialmente em 27 de junho de 1857, a cidade de Canguçu reúne hoje em suas altas atitudes uma população estimada em mais de 57 mil habitantes, dos quais uma em especial, além de ser considerada uma ilustre canguçuense, também é reconhecida como uma das mais antigas moradoras ainda vivas da localidade, bem como do próprio País.

A carteira de identidade expedida há 21 anos corrobora que Presolina Coelho chegou em 24 de julho último, no auge dos seus 111 anos. Nasceu, portanto, em 1899, quarenta e dois anos depois da fundação do lugar que ainda hoje vive e mantém um carinho todo especial.


Próximo de completar dois anos de circulação, o caderno Feliz Idade chega hoje a sua 100ª edição homenageando esta ilustre canguçuense e também ‘supercentenária’ – como são chamadas as pessoas que ultrapassam a faixa dos 110 anos.

Ela que foi “parteira”, ajudou no parto de inúmeros bebês e criou outros tantos, numa época em que para se deslocar o meio de transporte utilizado era o cavalo e a charrete.


Agradecimentos, porém, precisam ser efetuados.

Em especial a Heloísa Telesca Motta, 64 anos, que, gentilmente, entrou em contato com a nossa equipe para sugerir a presente reportagem com a notável cidadã de sua terra natal.

Heloísa, que reside hoje em Rio Grande, passou os contatos de sua família em Canguçu aos repórteres do Feliz Idade, que foram fortemente acolhidos na última segunda-feira, 23, pelo seu irmão, Adriano Telesca Motta.

Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Canguçu, Adriano recebeu-nos em seu escritório localizado ao centro do Município. Assim que cumprimentou os repórteres, o advogado fez questão de repassar algumas informações sobre a dinâmica e o modo de vida local, um pouco de sua história, bem como mencionou o que dona Presolina representa para a cidade.

- Ela é um ícone de longevidade -, enfatizou Adriano.


O advogado fez questão de disponibilizar uma de suas funcionárias e o filho, Augusto (foto acima), para que acompanhassem-nos até o local onde reside a entrevistada. Atencioso, Augusto não só recepcionou a equipe do Agora no local, como também participou ativamente da entrevista que você acompanha nos parágrafos a seguir. Boa leitura!

Catuia


Ela vive numa das regiões mais altas de Canguçu, uma cidade encantadora que integra as chamadas “Serras do Sudeste”, contemplada por 386 metros de altitude. O lugar onde reside já há alguns anos é conhecido como a Região das Antenas.


Popularmente, ela é conhecida nas ruas como Dona Catuia, um pseudônimo que rapidamente a identifica e que foi carinhosamente adotado por Presolina Coelho, que já algum tempo mudou-se para a casa de sua cunhada, Teresinha de Jesus Nunes Coelho, a completar no próximo sábado, seus 70 anos.

É Teresinha quem recepciona a nossa equipe de reportagem e traça uma breve sinopse sobre a trajetória e a personalidade de sua ilustre moradora. Também é ela quem nos conduz até o andar de baixo, onde Presolina vive separadamente, sem quaisquer tipos de interferência.


“Ela é muito independente e não gosta de esperar pelos outros”, define sua cunhada. Este, por sinal, é um dos traços de sua personalidade que nossa equipe depara-se tão logo adentra à casa de Catuia: tudo arrumadinho e em seu devido lugar.

Como fomos recebidos? Com largo e afetuoso sorriso indicando que podíamos entrar e nos sentir a vontade. A cozinha divide o espaço com o seu quarto, sendo os ambientes limitados por armários e pelo guarda roupa.


E é na cozinha, o ambiente preferido de Catuia, que ela enfrentou por mais de uma hora a enxurrada de perguntas, em algumas horas apenas respondendo: “A gente esquece muita coisa”, evidenciando que embora bastante lúcida para a sua idade, a memória falha, como já era de se esperar.

No entanto, comemora o fato de ter uma saúde admirável e como todos a partir de uma idade mais avançada, prioriza a atenção aos problemas do coração, consequentemente, aos de pressão.

Casou apenas uma vez, diz que foi feliz no casamento e que depois não quis mais saber deste assunto. “Sou do tempo em que a gente casava uma única vez”, observa. Confessa que se sentiu sozinha, porém, obteve a companhia dos filhos e netos.

A mais velha de cinco irmãos, lamenta só ter sobrado ela. Além do marido, também já perdeu a companhia dos dois filhos legítimos que teve e também de outros que crescer e ajudou a criar.


Apesar de tudo, não tem rancor, muito menos medo da morte. “A hora chega para todos. Quando Deus quer, precisa, Ele leva... Sinto-me abençoada por chegar até aqui”, reflete.

Dos seus lazeres, lamenta a ordem médica de se manter afastada das suas panelas e de suas receitas. “Sempre gostei de cozinhar. Hoje quanto muito só posso esquentar uma água. Estou proibida de me aproximar do fogão. Eles têm medo que eu perca a força, caía ou me queime”, aponta com pesar.

Por outro lado, diz que ainda tem forças suficientes para outras atividades domésticas, como lavar roupa, capinar ou mesmo varrer a casa. Não tem hora para dormir e confessa que dorme várias vezes ao dia e que sonha bastante também. Não gosta de futebol, pois o define como um “jogo bruto”.


Gosta de ouvir as músicas do rádio ou mesmo ver as novelas que passam na televisão. Quando disposta saí para visitar os vizinhos ou dar uma volta, mas adora mesmo receber as visitas. Adora conversar sobre qualquer coisa, qualquer assunto!

Na vida, a única coisa que diz que realmente lamenta é o fato de não ter aprendido a ler, algo que sempre a deixou inquieta, justamente por depender dos outros para saber do que se trata algum documento ou mesmo escrever um reacado.

Por outro lado, mesmo sem estudos, diz que sempre teve o respeito e educação pelas pessoas, algo que não vê e nem percebe no comportamento atual dos jovens alfabetizados.

“Os verdadeiros analfabetos são os que aprendem a ler e não lêem”, proferiu certa vez o notável Mário Quintana, que também pode ser complementado por Dean Inge: “O importante da educação é o conhecimento não dos fatos, mas dos valores”.

Do mundo tecnológico e virtual está alienada. Aliás, sempre preferiu assim. Não tem ideia, por exemplo, de que seu nome consta na Lista de Supercentenários Brasileiros do site Wikipédia, muito menos de que esta reportagem será publicada no Blog do caderno Mulher Interativa.


Sobre o assunto, lembra-se aos risos da primeira vez que ela e uma prima viram um carro. “Saímos corremos, foi um susto!”, diverte-se. Tanto a visão, como a audição e os movimentos são relativamente bons para quem tem 111 anos.

Sobe e desce firmemente a ladeira da casa onde vive com Teresinha. “Ela ama costurar e nem precisa de óculos”, sinaliza sua cunhada, aos risos concordantes de dona Presolina.

Sem receitas


Catuia diz que não há receitas de longevidade. No entanto, responsabiliza uma herança genética. Sua avó materna, por exemplo, faleceu aos 105 anos depois de sair de um dos bailes da cidade. “Ela adorava dançar e eu também sempre gostei”, entrega ela. Quando perguntamos o que faz da vida mais bonita, ela logo expõe:

“Tanta coisa!”, tomando ar e complementando: “Sempre gostei de festas e adorava ver o Carnaval. Não perdia um”, brinca ela, responsabilizando a avó pelo espírito festeiro, no passado muito oprimido pela escravidão. “Minha avó foi escrava, eu não”, comenta ela, que embora não tenha passado por esse tempo admite que muito sofreu e foi alvo de preconceito.

Parteira


Ainda da avó, pela conversa uma grande referência de sua juventude, herdou também a paixão por uma profissão, já alguns anos extinta. Atuou por muito tempo como parteira! Na profissão, orgulha-se de nunca ter perdido uma criança e culpa sua fé por este feito.

Através das vidas que trazia ao mundo conheceu muita gente importante. Cuidou de muitas crianças. “Sempre tive bons patrões”, explana. A avó foi quem fez o parto dos seus dois filhos e ela, Presolina, quem trouxe ao mundo cinco dos sete filhos de dona Teresinha.


Durante a entrevista, Teresinha respondeu a pergunta de como será a vida quando dona Catuia partir: “Ela vai deixar um vão, vou sentir falta. Hoje agradeço a Deus apenas por ela chegar a esta idade, ser feliz e saudável”.

Sem sombra de dúvida, dona Presolina faz parte daquele seleto grupo de pessoas que quando partir irá deixar tudo muito melhor do que havia encontrado. Viver mais de um século é mais do que ter muita história pra contar, é fazer grande parte desta história, desse período tão longo e ao mesmo tempo tão curto e fugaz.



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