5 de dezembro de 2009

PROPINATONE

Escândalo de corrupção e suposta distribuição de propina é considerado o mais bem documentado na história do País. No caderno, mulheres de todas as idades comentam com fortes críticas sobre o mais novo esquema de corrupção da política brasileira

Escrito por Bruno Zanini Kairalla - bruno.kairalla@gmail.com
Colaboração de Melina Brum Cezar - melina@jornalagora.com.br
Editora Rosane Leiria Ávila - rosane.jornalagora@gmail.com
Fotos: Bruno Kairalla/Jornal Agora




Há quem diga que política não é assunto de mulher. E não é mesmo. Política é assunto de todos aqueles que lutam com o seu suor por uma vida digna, por um país mais justo e sonham com um futuro próspero não só para si, mas para todos aqueles a quem amam.

É por esta razão que o Mulher vai debater o assunto do momento: o “Propinatone”, ou o já chamado de “DEMensalão”.


Na reportagem que se segue, além de traçarmos um panorama geral sobre os últimos acontecimentos, ouvimos o que as mulheres, representantes de todas as faixas etárias, acham sobre o mais novo escândalo político brasileiro. E pelo apurado senso crítico de nossas cinco entrevistadas, elas mostram que estão por dentro, mais afiadas do que muitos homens pensam!


As imagens de políticos recebendo e repartindo dinheiro de forma ilegal são perigosas, pois levam muitas pessoas a acreditar que político e corrupção seriam a mesma coisa. De fato, muita coisa tem vindo à tona nesse sentido. Corrupção nos mais variados níveis, partidos, nomes. Mas, jamais, podemos aceitar que política seja o mesmo que corrupção, que ela seja tolerada como algo natural, embora no Brasil de hoje pareça inevitável.

ENTENDA O CASO
A receita do “Propinatone”


Aconteceu em Brasília, capital do País e berço do cenário político brasileiro. O fato na verdade rola desde 2003, mas só na sexta-feira, 27 de novembro, veio à tona através da operação batizada de Caixa de Pandora, deflagrada pela Polícia Federal (PF).

O governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda, do partido dos Democratas (DEM), foi apontado como o principal articulador do esquema de corrupção envolvendo integrantes de seu governo, empresas com contratos públicos e deputados distritais.


O esquema de suposta propina fez ruir o governo de Arruda. Na mesma sexta, agentes da PF cumpriram mandatos contra 16 pessoas físicas e jurídicas e apreendeu nas buscas mais de R$ 700 mil em dinheiro, além de US$ 30 mil e 5 mil euros.

Flagrados diante de incontestáveis imagens captadas pelo agora ex-secretário de Relações Institucionais do Governo, Durval Barbosa, que em troca de redução de pena fez um acordo com a PF, nos vídeos, Arruda e aliados aparecem recebendo maços e pacotinhos de dinheiro. Alguns, colocando-os dentro das cuecas; outros dentro de meias, bolsas e bolsos de paletó.


As imagens chocaram todo o País. De acordo com o inquérito da PF, há indícios de prática dos crimes de formação de quadrilha, corrupção passiva e ativa, peculato e fraude em licitação.

O inquérito coloca Arruda sob acusação de crime eleitoral, supostamente cometido a partir de 2003, antes de sua eleição para o Governo do Distrito Federal - e que teria sido mantido após assumir o cargo. Conforme a investigação, Arruda teria recebido dinheiro não-declarado de empresas privadas para sua campanha, prática conhecida como "caixa dois".


Os diálogos coletados apontam que, após sua eleição, Arruda teria transferido parte desse dinheiro para parlamentares de sua base. O DEM foi o principal porta-voz da oposição nas críticas ao mensalão do PT, denunciado pelo então deputado federal, Roberto Jefferson, em 2005. Com a denúncia de um esquema similar envolvendo Arruda, o discurso do partido de defesa da moralidade pública pode ficar enfraquecido.

Símbolo do escândalo

A moda agora é trocar a pizza pelo panetone. O pão doce virou o símbolo dos protestos contra o governador do Distrito Federal, depois que ele, em suas primeiras notas oficiais, justificou que o dinheiro recebido nas imagens foi empregado na compra de panetones, distribuídos em suas campanhas de final de ano, para crianças e famílias carentes. O dinheiro seria suficiente para abastecer o Varjão, uma das regiões administrativas mais carentes do DF, com mais de 12 mil panetones.

A mais conhecida lenda sobre a origem desse pão, data do século 17, ao Norte da Itália, em que um padeiro chamado Toni, num dia de grande inspiração, preparou um pão doce e leve. Ao acrescentar na receita, frutas e passas, ele passou a vender o produto pela cidade. Com o sucesso, surgiu, então, o “Pane de Toni”, até virar panetone.

ENQUETES:
Vai um PROPINATONE, aí?!


Com um panetone em mãos, a equipe de reportagem do Mulher foi às ruas. Afiadas, as entrevistas mostraram que estão bem informadas. Confira:

Amarga vergonha
Diante da pergunta sobre as atitudes do governador Arruda, dona Maria da Conceição Perret, 59 anos, rebateu na hora: “Dá para chamar isso de atitude?”, questionou.


“Um homem público, porém, longe de ser um homem de caráter, que como a maioria dos políticos deu a desculpa de um panetone para justificar um erro. Pegou muito mal. Mas, como isso sempre volta à tona, só nos mostra que esse é o país da falta de caráter, onde o povo é mal representado, não tem educação séria, muito menos memória política. Um povo cada vez menos politizado e que se deixa corromper por qualquer bobagem. A mudança deste cenário começa em casa e na escola. Lembro quando meus filhos foram fazer o título de eleitor, só pedi a eles: tenham liberdade de escolha, mas, acima de tudo, capacidade de escolha e discernimento”, revelou dona Maria.

Qual o gosto do panetone para ela? “Amargo de vergonha, se é que vergonha tem gosto. Mas se tiver, com certeza é amargo”, finalizou.

Banalização da vida
A funcionária pública Nory Ferreira, 45 anos, deu risadas quando apresentamos o novo lançamento para o Natal, o “Propinatone”. “É assustador o nível de impunidade que permite que as pessoas envolvidas nesse caso façam aquilo com a maior tranquilidade. Temos uma legislação muito permissiva e esse é um dos principais problemas deste País”, relaciona Nory, que já morou em Brasília e afirmou conhecer bem o clima impune que rola por lá.


“Mas por aqui também e em tudo que é lugar”, acrescenta ela. Quanto à permissividade dos brasileiros nos escândalos políticos, ela comentou que hoje se vive numa banalização extrema dos fatos.


Por conta dessa banalização, é que Nory acredita que se tornou normal os escândalos na política brasileira. “Se todos fazem, por que eu não vou fazer?”, expõe ela. Ela finaliza com um recado: “Quando toleramos mal exemplos, damos o espaço para que outros se criem. Em Rio Grande, por exemplo, elegemos um prefeito que já foi afastado por não prestar contas sobre a empresa Noiva do Mar e dois deputados estaduais que votaram para que não fossem investigadas as contas da governadora. Acho que nós ficamos mal para querer discutir o mensalão dos outros. Nós temos os nossos”, pontua.

Gosto azedo
Para a atendente do Villa Francisca, Karina Costa, 35 anos, o gosto do Propinatone não é só amargo, é azedo, pois “amargo ainda desce na garganta. Azedo não tem o que faça a gente engolir”, apontou ela.


Perguntamos a Karina se os escândalos políticos deixam os brasileiros com cara de palhaço. “Com certeza. Mas acho que os brasileiros até gostam de ficar com a cara de palhaço, pois conseguem eleger uma pessoa que já havia renunciado do cargo para não ser cassado”, disse.


“Alguém tinha que avisar Arruda e outros governantes, como os nossos aqui, para darem uma desculpa melhor, porque ao invés de panetone, as famílias precisam é ir num posto médico e serem atendidas com dignidade”, sinalizou Karina.

Fatia gorda
Panetone ou dinheiro? Com qual dos dois fica a autônoma Paula Almeida da Rosa, 26 anos? “Uma fatia bem gorda, que nem a deles!”, indicou ela.


“Acho que os políticos não possuem a mínima noção do que é ética, sabem apenas do jeitinho brasileiro. Política, hoje em dia, não é mais política. Ela se resume num jogo de interesses próprios e na conta bancária, pois é o que eles visam e não o bem da população. Ela tenta esconder o que é a realidade e estimula as pessoas a serem ignorantes. Por outro lado, as pessoas votam por votar, sem saber passado político de um candidato. É por isso que um cara como o Arruda consegue voltar ao poder, mesmo depois de renunciar por mentir em 2001”, declarou ela, demonstrando estar bem informada quanto ao grave cenário político.

Sabor mentira

Apesar da pouca idade, Ana Luisa Cosme, 17 anos, mostra por baixo do figurino de sua personagem “Guininha”, que é uma mulher de forte opinião. Para ela, a história de dar panetones para famílias carentes seria muito bom se fosse verdade.


“Como eles gostam de nos fazer literalmente de palhaço. Quem iria acreditar num absurdo desse? Eles estão é levando o panetone sabor mentira para dentro da casa deles, isto sim”, comentou.


Ana nos conta que ainda não é uma eleitora, mas que em 2010 será sua obrigação e que, como toda obrigação, pretende cumpri-la da forma mais informada e responsável possível. O Brasil agradece. “Essa história me deu um aprendizado para pensar bem no que vou fazer. Pretendo pesquisar, saber da vida de cada candidato. De palhaça ninguém vai me fazer”, concluiu ela.

AGRADECIMENTO:
O Mulher agradece a toda a equipe de funcionários do restaurante Villa Francisca, cenário em que foi realizada a maior parte das presentes entrevistas.


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